Tic tac... tic tac... tic tac... zzzzzzzzzz....zzzzzzz.....zzzzzzz....BUÁÁÁÁÁÁÁÁ!!! E um sobressalto me faz despertar às cinco da manhã. Em outra época ou outra circunstância, eu estaria "com sangue nos olhos" de tanta raiva. - Quem terá sido o doido que ousou me acordar a esta hora? No tempo e nas circunstâncias atuais, nenhuma reação de ira. Só há prazer e alegria.
Um filho é alguém com poderes mágicos, capaz de nos fazer felizes até a desoras. Aquele sorrisinho de quem está satisfeito com a mamadeira oferecida espanta qualquer mau humor.
O azul do berço, com seu véu e seus acolchoados, inunda o quarto, e a nuca quente do bebê no meu braço me faz ter o entendimento pleno de que Deus existe e que olha por nós.
Mas essa não foi a vida que eu pedi a Deus. Meu filho chegou por pura casualidade, dessas que dariam livro ou um bom mote para telenovela. Não foi a vida que eu pedi a Deus, mas foi a vida que Ele me deu. E ela é melhor e mais plena que com qualquer bobagem que eu já tenha desejado.
Cinco da matina e eu faço a ronda pela casa. Do quarto até a cozinha, para lavar e guardar a mamadeira, deixando-a pronta para a próxima hora da fome. Uma olhada na cachorra para ver se está tudo bem com ela, senhorinha de 11 anos que é. Vasculho alguns cantos inusitados da sala, à procura do trio de felinos que emprestam charme e boas energias ao ambiente.
Num dos quartos, o verde, lencinhos, toalhinhas e fraldas. Vejamos o que estará a minha espera naquelas fraldinhas. Onde existia qualquer nojinho ou frescura, agora não há nada. Qualquer mau cheiro é ignorado por completo. Só interessa conferir as dobrinhas e passar pomada antiassaduras.
Quem tem um filho pequenino também deve estar preparado para a enxurrada de diminutivos. Muitas palavras parecerão incompletas se não tiverem o sufixo "inho" ou "inha": fraldinha, papinha, boquinha, pezinho. Fralda, papa, boca e pé não lhes servem mais como sinônimos.
Um beijinho na bochecha do menino com nome e carinha de anjo, duas ou três musiquinhas sussurradas, maõzinhas unidas e zzzzzzzzzz. Pronto, o bebê vai dormir de novo, até umas nove horas da manhã.
Para quem tem um filho pequeno, essas tolices ganham um significado importantíssimo. Nada de Os Lusíadas ou Dom Quixote: o texto mais lindo e bem produzido de toda a literatura universal é o gugu-dadá dele. Uma nova nuance num movimento simples faz do nosso filho muito mais que a Daiane dos Santos ou o Diego Hypólito. Uma chacoalhada com as perninhas na banheira terá muito mais valor que qualquer braçada do César Cielo ou do Michael Phelps.
Ter um filho bebê é descobrir que o rosto mais lindo do mundo é de um serzinho quase sem cabelos; e que do sorriso mais lindo de todos os tempos não consta um dente sequer.
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