Certeza? |
Escrito por Jamil Alves | |
22-Abr-2015 | |
"Certeza" é uma palavra que vai acabar sendo registrada pelos dicionários daqui a algum tempo como um arcaísmo, pelo simples e incontestável fato de que certeza é um conceito muito abstrato e sobre o qual saberemos cada vez menos.
"E foram felizes para sempre" parece ser uma expressão em desuso. Gostamos de acreditar que seja possível ser feliz "para sempre", mas não conseguimos definir o que é "sempre", nem muito menos o que é "ser feliz". Como é possível ter alguma certeza num mundo em que há tantas causas importantes sem voz e tantos canalhas com megafones povoando os noticiários? Bem, se ser feliz for ter essa felicidade protocolar, cheia de regras, scripts, de RGs e CPFs, eu pulo fora. A falta de certeza é mais perceptível e crônica hoje possivelmente porque a inocência perdeu terreno, mas não faltaram vezes no passado em que uma certeza se revelou algo absolutamente falso. Aproveitando este feriado de 21 de abril, Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, acreditava que seus ideais libertários poderiam ser postos em prática. Tancredo Neves, há 30 anos, pensou que seria presidente da nação. Ambos estavam errados.Pessoas interessantes não buscam certezas em suas vidas; buscam, antes, viver sem fricotes. Trocam de cidade. Compram passagem só de ida. Têm filhos, adotados ou naturais. Começam do zero muitas vezes. Reinventam-se. Mudam de escola. Desistem do curso. Pedem demissão antes de arrumar outro trabalho. Casam-se, descasam-se e voltam a se casar. Mudam de cor preferida e de prato predileto. Tornam grandes as pequenas decisões pela intensidade e alegria com que vivem. Essas pessoas interessantes (sí, ¡las hay!) são como um instante de aplausos de uma arquibancada cheia e a celebrar altos feitos. Carregam consigo certo virtuosismo que todos gostaríamos de ter. São luminosas, leves; não se preocupam com o espetáculo nem buscam para si certezas cósmicas ou precisões matemáticas. Os outros, os desinteressantes e os chatos, são o palhaço que não fez rir, o trapezista que tombou e fugiu. O dono do circo, que pensa na amargura de seus impostos a pagar e em tantas outras adversidades. Neste mundo nosso, de símbolos e de incertezas, precisamos ter mais confiança. Devemos voltar a confiar mais em nós mesmos e nos outros. Precisamos estender o braço e tirar do bolso o dinheiro para pagar a conta, mas sem nos sentir obrigados a conferir o troco (momento em que pressupomos que, se não o fizermos, seremos lesados). Antigamente, matava-se e morria-se do mesmo jeito, mas sem os dissabores nem as urgências dos estresses modernos. Mesmo que não tenhamos o necessário desprendimento para pagar sem conferir o troco, para dar sem esperar receber ou para amar sem querer nada em troca, esta é, em todo o caso, uma oportunidade para refletir sobre o destino obscuro daqueles que vivem suas vidas em busca de certezas. |
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