Os parasitas |
Escrito por Jamil Alves | |
05-Ago-2015 | |
Já faz alguns anos, uns cinco, que a imprensa fez chegar a nós a notícia de que um jornal acadêmico do curso de Farmácia da Universidade de São Paulo, O Parasita, lançou uma "campanha" que incentivava os alunos a jogarem fezes em homossexuais. E, que fique claro, "jogar fezes em um homossexual" é, aqui, puro eufemismo para suavizar a crueza do pasquim em questão.
Os editores de O Parasita quiçá tenham tido a infeliz ideia de publicar o que publicaram porque têm tempo parasitário demais para poder concluir suas atividades acadêmicas. Afinal, sua universidade permite que um curso de quatro ou cinco anos possa ser concluído em até dez, o que incentiva o surgimento de uma curiosa categoria: os "estudantes profissionais", que estudam, estudam, pesquisam, pesquisam, porém não contribuem com o mundo adulto, do trabalho; dão pouco ou nenhum retorno de seus conhecimentos e anos de estudo à sociedade. Morosidade e leniência são as bases de muitos dos serviços públicos deste país. Desperdiça-se tempo na ociosidade endossada pela ineficiência e complacência dos órgãos públicos brasileiros, em todos os níveis: federal, estadual e municipal. E a equipe do jornaleco não poderia ter sido mais feliz na escolha do nome do jornalzinho que publicam.Falar de algo do passado, ainda que não tão distante, parece requentar um assunto, mas as discussões em voga atualmente nos âmbitos político e social do Brasil dos Malafaias e dos Bolsonaros são praticamente as mesmas: intolerância, homofobia, violência urbana, violência racial, sexual etc. Enquanto isso, na Sala da Justiça, digo, em Uganda, na África, um dos países mais miseráveis do mundo, um projeto do deputado David Bahati que pretende punir com pena de morte a homossexualidade, que já é criminalizada no país, parece ganhar força e congregar importante parcela da população. A questão central é "como admitir que o Estado interfira na intimidade, na vida sexual das pessoas"? Naquele país, a AIDS, a corrupção, a miséria, a fome e a violência contra as mulheres são, elas sim, chagas que devem ser combatidas e extirpadas. De resto, o que é privado deve ficar no âmbito privado, o Estado não tem nada com isso. Sou tomado amiúde por uma sensação de que estou num ônibus e "não desci ainda, mas já puxei a cordinha, quero descer!", porque é preciso combater deste mundo os parasitas todos: os do jornaleco universitário, parasitinhas letrados que incitam a violência, o senhor David Bahati, que deveria cuidar dos reais males do seu país, bem como o líder islâmico iraniano Hojatoleslam Kazem Sedighi, que dia desses culpou as mulheres que usam roupas curtas pelo recente aumento da atividade sísmica no planeta. Ou seja, amiguinhas, suas minissaias e seus decotes são os verdadeiros culpados pelos terremotos recentes nos quatro cantos do mundo. Placas tectônicas? Qual o quê! Detestamos vocês, suas feias! Cubram-se, por favor! E eu, cá comigo, continuo com a mão na cordinha. Quero descer do ônibus e pegar um táxi para o século XXII, para ver se chego mais rápido. Será que consigo um? Ou sigo o que diz o refrão de uma canção do Cazuza e embarco num trem pras estrelas?
Para saber mais:
http://www.bbc.com/news/world-africa-16963339
http://www.theguardian.com/world/2010/apr/19/women-blame-earthquakes-iran-cleric |
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