Nem tão mau assim |
Escrito por Jamil Alves | |
09-Dez-2015 | |
O ano de 2015 trouxe consigo a força de uma tempestade assombrosa. 365 de fatos inusitados, crise econômica, turbulência política, desvalorização do real, risco de impeachment da presidente do país, falta d'água, escolas ocupadas por estudantes contrários às reformas propostas pelo governador do estado.
Na véspera do meu aniversário (ah, os quarenta!), o risível empresário Donald Trump anunciou sua candidatura à presidência dos Estados Unidos. A oposição brasileira, liderada por Aécio, anunciou ida à Venezuela para pedir libertação de presos na "democracia a la Chávez". Na data exata do cumpre anos, Cristina fez reajustes em programas sociais antes das eleições presidenciais em seu país, a Argentina. Afinal, não é só por aqui que "se pedala" nas contas públicas. Nesse dia, o que dominou também a chatice do noticiário foi "Um Brasil destemperado cai ante a Colômbia por 1 X 0", série de resultados ruins que tiraria o Brasil da Copa América disputada no Chile.O futebol está guardado na minha gaveta de irrelevâncias. Aprendi a odiá-lo desde pequeno, quando via meu pai catatônico na frente da TV e com o pescoço inclinado para a orelha segurar o rádio de pilha, principalmente nos momentos em que eu queria atenção. No entanto, um mau resultado nesse esporte também me afeta, piora o ambiente, o humor dos colegas e dos amigos. É o esporte mais amado dos brasileiros. A insônia, algo relativamente novo para mim, aumentou a frequência das visitas e agora vem me ver de duas a três vezes por semana. A consciência acorda muito antes do tempo marcado no despertador do celular e a mente entra, então, numa espiral de ansiedade e preocupações, a certeza do precipício para o qual todos caminhamos: a natureza, o estado, o país, o corpo, as profissões e o futuro dos filhos. A crise moral à esquerda e à direita (e à frente, pobre porvir!), o fisiologismo crônico e arraigado da política brasileira, o desmanche nas redações de jornais, nas produtoras de TV, no teatro e no cinema, os celulares ganhando com folga dos professores quanto à atenção e ao carinho dos alunos, estupidificados pelo reflexo de suas ninharias nos dispositivos, homens-bomba e atiradores de tudo quanto é sorte espalhados pelo mundo, tudo isso, enfim, põe uma pedra sobre os bonitos ideais traçados para nós muito antes, na Revolução Francesa. Tudo isso torna, na verdade, o século XX tão obsoleto e passado quanto o século XIX, aniquila o mundo como nós o conhecemos, e a verdade é que dá medo testemunhar a história. O conforto de casa e a companhia dos seres amados em ocasiões como meu aniversário, com guloseimas deliciosas, principalmente coxinha e brigadeiro, acabaram alegrando um pouco mais meu ano, porém temi pelo porvir e acabei tendo a impressão de que brindávamos vãs alegrias monárquicas em meio ao Baile da Ilha Fiscal. Ocorreu-me uma agonia, um "comam logo e corram, que a República vem aí"! Semana passada, o médico me mandou aumentar a dose do remédio contra a hipertensão. A fisioterapeuta mandou perder peso e fazer alongamento todos os dias. Não imaginei que esse troço de envelhecer fosse acontecer comigo, mas pelo menos parei de tratar com deferência aqueles para quem eu sou apenas mais um na fila do pão francês. O passar do tempo é chato, envelhecer dá trabalho, porém é nem tão mau assim.
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