Escrito por Umba Hum
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25-Abr-2022 |
Num domingo qualquer modorrento tem nas mãos O poço da solidão de Margarethe Radiclyffe Hall, Coleção Clássicos Modernos, Abril Cultural, 1974, tradução de José Geraldo Vieira e conjectura quanto à literatura: a referência são os que escapam de um ponto fixo para assim poderem ver melhor as coisas; quiçá d´ângulo inusual. Hemingway escapou do conforto da Toronto Star para viver como um errante na festiva Paris. Faulkner abriu mão de tudo para escrever, entre som e fúria, sobre um sul inexistente com a guerra de Secessão. Beckett vagava como os mendigos de suas peças e foi esfaqueado numa rua de Paris. Cortázar era um funcionário da UNESCO que se dedicava a dar asas à sua fantástica imaginação.
Dostoiévski fugia dos credores como o diabo da cruz e perdia o que não tinha como jogador. Lúcio Cardoso e sua insensata e esgotada Crônica da casa assassinada. Clarice vivia enquanto escrevia e para viver deixou de lado a cômoda vida de mulher de Embaixador. Joyce James, um jesuíta exilado irlandês e papéis com anotações ilegíveis pelo mundo. Balzac, compulsivo, desdenhava saúde e outra veleidade de ocasião para criar as ilusões de Rubempré. Bolaño e o misterioso e incerto destino de escritores latino-americanos no trânsito entre a periferia e o centro. Mais alguém? Vejamos: Virginia Woolf e seu incômodo com a vida, malgrado o Bloomsbury; Camus, e o absurdo encontro com arvore no meio da estrada; Kafka, queria uma pira para seus rabiscos; Proust, rabiscou no leito de morte; Francis Fitzgerald e os anos loucos da era do Jazz; Emily Brontë, talvez melhor Ellis Bell, e a tênue fronteira entre masculino e feminino. Para eles, para elas..., um ponto fixo era cômodo e tedioso; para eles..., o constante desafio dos motivos, ou de motivos plausíveis para escrever. Por isso, escrever e nada esperar além do simples ato de escrever. De resto, as feiras de vaidades, os andaimes, a ilusão de que se é lido compreendido e adorado como escritor. Outros poderiam ser incluídos? O que impulsionava Lima Barreto? Assim como Maria Firmina dos Reis no Segundo Império sob regime escravista, Amélia de Freitas Bevilaqua e sua Angústia, de 1913, 202 p., editada por Besnard Frères, não reeditada.
Põe Radiclyffe Hall de lado; procura Edgar Allan Poe na estante com suas histórias extraordinárias; não encontra Poe e sim as concretudes valverdianas publicadas pela Patuá de Eduardo Lacerda. Lê o posfácio, escrito por um amigo que não vê há décadas, e depois vai pro concreto. Das Concretudes (reviu Valverde no lançamento, na Patuscada livraria, que lhe inspirou uma crônica...), antes do sono, se atém à tentativa de homenagem a Poe.
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Atualizado em ( 26-Abr-2022 )
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