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Onda Latina

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19.Abr 2024
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Com a Bê e sem ela PDF Imprimir E-mail
Escrito por Umba Hum   
03-Jul-2022
caminito_foto_fv001.jpgEm determinados momentos não se pode dizer muitas coisas da vida, do mundo; mas pode-se imaginar, pode-se recolher cacos de momentos. Leu, anos atrás, Uma biografia de Edmundo Wilson, escrita por Jeffrey Meyers, Editora Civilização Brasileira, tradução de Fausto Wolff; deve tê-lo emprestado a alguém: olha as estantes em sua biblioteca e não o encontra. Fica a recordar o modo como o biografo dá sentido a momentos fugazes da vida do biografado: o ambiente em que viveu, sua formação, os encontros e desencontros amorosos a ambição de se tornar um grande romancista... E, com as recordações: “Hoje posso olhar para trás em retrospectiva: dei um giro de 180º – mudei muito; estou razoavelmente convicto de que não tenho praticamente nada do que antes constituía minha têmpora. Essas mudanças; tudo isso fez de mim uma persona com traços irreconhecíveis para os de antanho. Durante muito tempo compus um tipo – algo que se incluía de forma afetada ao meu humor; uma certa tendência à exasperação; uma certa curiosidade para sondar minhas próprias defesas. Hoje muito menos que um tipo, ganhou forma própria, se constituiu em um ser à parte no meu espectro ou, para cair num pedantismo vulgar, no meu fantasma interior. Às vezes, como agora, sei que posso ter um tipo de distração – com um quê de fascínio, coloco-me junto a uma situação ou coisa simplesmente absorta. Penso, então, em pensar nela; penso numa viagem; penso em Edmundo Wilson, cuja biografia me escapou e de que sinto falta; penso em ajeitar as notas de uma vigem; uma viagem que fiz com a Bê; uma viagem em que ela não esteve presente”.

Algumas horas na estrada; algumas paradas; o almoço no..., com a Bê, os primos... Antes do início da viagem um telefonema para ela, um e-mail. Ah! Essas formas de correspondência moderna (Madame de Sévigné, Choderlos de Laclos, Voltaire tinham outros meios). Ah! Essas correspondências amorosas; todas tão tolas. A viagem? Alguns dias num sítio nos arredores de Ribeirão Preto. A manhã, límpida, desnudava-se aos meus olhos; a estrada, a Bandeirantes, quase vazia (passava-me à mente um som de Pat Matheny); uma temperatura amena (embora estivéssemos no inverno) e a paisagem campestre à medida que me afastava da metrópole. A Bê no banco de trás do carro junto com a Flora, o Pedro ao meu lado. Gosto de pensar na Bê: elo profundo que me liga aos segredos da vida. A Bê é um animalzinho dócil, sagaz, que me espreita com ar inquiridor e que me revela algo de novo. Apraz-me perceber como a Bê desvela o mundo; suas descobertas são algo como uma segunda chance em minha vida. A Bê, por minha causa, realiza o que não esteve a meu alcance. Com ela, sinto que minha melancolia ganha novos contornos. Passar o tempo com a Bê é ter aberto o sentido para as pequenas e significativas coisas que me cercam.

Mudei um pouco de humor ao longo da estrada: foram trezentos quilômetros de viagem. Já dirigi em viagens mais longas: ano retrasado percorri mil e duzentos quilômetros até chegar a Gramado – com direito a um pequeno tour por Shangri-lá, primeiro ponto turístico do litoral sul gaúcho. Cruzada a fronteira dos quarenta, já devia olhar para trás de forma, por assim dizer, menos culpada. Noto que as pessoas quando chegam à minha idade denegam suas experiências e com isso vejo-as amadurecidas. O passado para muitos é, sem equívoco, página virada. Olho para trás e, provavelmente, porque não consigo virar a página, não só sinto que não amadureci como, na mesma medida, que as coisas ficaram na expectativa. E, quando me olho com toda a atenção, me vejo frequentemente como uma expectativa: meio termo entre fracasso e realização. Por isso, tenho sentimentos estranhos em relação a Bê: ela, a Bê, é também um passo, um passo incompleto na jornada da vida. Por isso, como se tivesse um espelho adiante, projeto minhas angustias diante do que não realizei no campo amoroso. Por isso, sinto que ela, não a Bê, é o extremo de uma realização: em carne e osso, a própria projeção de tudo que habita em minha imaginação.

Meu mau humor se recompôs; alterei o ciclo da vida e cheguei ao rumo estabelecido: um belo sítio situado na vasta planície entre São Carlos e Ribeirão Preto. O vilarejo mais próximo, Taquaral, dista dez quilômetros dele. No sítio, o sentido da vida é coberto pelo odor de merda de cavalo, pelo muuuuuuu de vaquinhas que pastam tranquilas e completamente alheias ao ritmo das coisas. A cena campestre realça a imaginação: os laços com o burburinho da cidade, com o tempo presente, perdem-se na vastidão de sensações; esses laços se estendem até fronteiras tão longínquas que não é possível imaginar pontos de contato...

“Acho que está bom assim”, ele refletiu. “Talvez devesse ser mais preciso nas descrições. Alguns detalhes, claro, esqueci de mencionar. O ano em que essa viagem ocorreu. O idade da Bê. Ela, sim, minha primogênita, acho que estava com cinco anos. Quem mais iria além da Bê e dos primos pequenos. De quem era o sítio. Como tinha surgido a ideia de passar alguns dias longe de São Paulo no período de férias. Quem era ela, a ausente, e por que ela não foi. Coisas que fariam o leitor ter uma silhueta dos traços que imprimem e retém uma situação narrada em pormenores. Mas, leitor? Por que imagino que essas notas serão lidas? Que essas notas, mesmo, ganharão forma – peguei meu caderno, ao acaso, como faço em momentos de isolamento; vi-as e pu-las em ordem: são notas esparsas. Fi-lo como muitos fazem com fotografias. Abrem o álbum, folheiam as páginas ao acaso, se retém em alguma foto; como ela, com fotos de uma viagem que fizemos a Buenos Ayres e que hoje, assim como a biografia de Edmund Wilson, são sei onde estão. Uma foto em Buenos Ayres. Que escrevi e pensei publicar no Onda Latina. Afinal o editor, sempre generoso, recebe bem minhas resenhas sobre romances latino-americanos... Assim, o leitor, caso o haja, comporia um sentido do que escrevo a partir de sua própria experiência, lembranças ou, não tendo nenhum elo com o que escrevo, simplesmente não daria sentido algum e quiçá teria disso que escrevo não mais que uma entre tantas coisas que se pode ler e que não merecem qualquer atenção”. Apesar de claudicante quanto a publicação, suas anotações esparsas transformadas em crônicas eram frequentemente publicadas no Onda Latina. Sabia, portanto, que suas anotações ganhariam uma forma e lhe impulsionaria a enviá-las ao editor. Sabia, outrossim, que isso nem sempre acontecia, ou que as anotações ganhavam formas inauditas, se entrelaçavam com outras anotações ou mesmo de uma anotações recolhia não mais que um parágrafo, uma frase, uma palavra e, por vezes, nem isso; só a atmosfera que uma situação propiciava. E assim compunha um caleidoscópio em que um motivo num lugar ensejasse ligação improvável com o de outro acontecimento em outro tempo.

No sítio, à noite, uma macarronada acompanhada de vinho; nada ostensivo: um St. German de Bento Gonçalves – o suficiente para acalmar o corpo e aguardar a queda do sono; tudo ao lado de uma biografia de Edmundo Wilson. Saudade é um sentimento estranho; súbito desvenda os espaços mais recônditos de nossa alma. O sítio é bastante agradável; muito espaçoso; pude, pois, me recolher a um canto, me isolar com meus pensamentos – melhor: minhas sensações interiores. E, com as sensações interiores como guia, buscar vestígios da existência dela. No fundo, estava precisando de isolamento; respirar um ar diferente. Ali, embora estivesse cercado de tanta gente – era um entra e sai sem fim e todos falando de tantas coisas ao mesmo tempo; conversas e risadas sem começo nem fim –, podia me dar o luxo de relaxar às convenções sociais: nada me obrigava a ficar ao lado dos que falavam sem parar. Todos sabem que em certos momentos sou meio saturnino.

Na primeira manhã no sítio, recolhi-me para um passeio matinal e me deixei absorver pela tranquilidade da caminhada. Andar, ficar exposto ao sol e girar meus pensamentos em torno dela; do que ela representa; como muita coisa mudou em tempo tão exíguo. Por mais que não supusesse, ela estava ao meu lado durante a promenade estival. Guardei um pouco do tempo para a tentativa frustrada de ligação pelo celular. Não me faz bem ficar tanto tempo sem ouvir a voz dela. A caminhada e o tempo caminhavam; eu, o caminhante, estava completamente absorvido em minhas divagações; num espasmo, lembrei que teria um novo semestre pela frente, que àqueles dias de férias se seguiriam o ritmo frenético da vida...

Tinha então esses rabiscos que lia e procurava neles encontrar um sentido. Entre tantos em seus vários cadernos com anotações que preenchia despretensiosamente e que relia de tempos em tempos. “Nesse instante, tento dar-lhes alguma forma. Embora jamais tivesse pensado em me desfazer deles – alguns, é verdade, se perderam nas mudanças da vida... –, fato é que eles, em momentos distintos, vagaram de um lado para outro e, por ela, agora igualmente ausente, e pela Bê, sinto um desejo enorme de, aos garranchos engavetados, preencher meu tempo tendo presente nele a ausência dela”. A ausência presente o faz, doce paradoxo, feliz e pesaroso: “Ontem – e posso me recolher para assim me expressar –, quase que intermitentemente pensei que a coisa que mais sinto falta é da presença dela. O discurso do ser ausente é também uma forma, ao mesmo tempo, de masoquismo (deliberadamente me afasto para poder medir, para dar sentido à ausência) e de necessidade: preciso me ausentar, para escapar ao ritmo enganador da vida e dar asas à imaginação”. É que o mundo, as coisas, também tem uma natureza palpável: devemos tocá-lo, e não ficarmos submersos o tempo todo à ilusão dos sentidos. “Ontem foi um dia claro, uma brisa matinal me exigiu um cardigan, camiseta, calça moletom e um par de chinelos Pé de Algodão; foi assim vestido que me pus a escrever estas notas; e foi assim que li outrora fervorosamente páginas e páginas da biografia de Wilson, que definitivamente dou por perdida...”. Pensar nela, então, em como tudo se compõe de pequenos fragmentos com sentido, em pequenos sinais, e pensar na Bê, para ele naquele instante presente, é pensar na escrita.

A terra cá é muito vermelha; a casa de campo é uma construção antiga, talvez dos anos cinquenta. Não fiquei curioso para saber da data; apenas conjecturei. Os quartos são amplos. Uma grande varanda em “L” reveste a construção. Ao lado da porta de saída da cozinha, há uma ampla mesa de jantar rústica; as cadeiras foram talhadas com todo cuidado pelo marceneiro. Nessa mesa deposito meus livros – um manual de italiano, um romance de Francis Scott Fitzgerald, outro de Ernest Hemingway e, como já escrevi, uma biografia de Edmund Wilson – e na qual, depois da caminhada, enxugo o suor, tomo uma cerveja e me ponho a ler e a escrever.

“O passado e o presente são feitos da mesma matéria: a imaginação, que é presa pela escrita. Ela existiu para que eu escrevesse e jamais lesse o que lhe escrevo; jamais tivesse sinais que significam para o outro o ser ausente”.

Foto: Caminito - Buenos Aires -  Franklin Valverde 
Atualizado em ( 03-Jul-2022 )
 
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