Herói. Morto. Diaféria. |
Escrito por Franklin Valverde | |
17-Set-2008 | |
Hoje fiquei sabendo que morreu o jornalista Lourenço Diaféria, vítima de problemas cardíacos. Isso me fez voltar aos meus 18 anos, mais precisamente a uma Bienal do Livro, quando ainda era realizada no Pavilhão do Ibirapuera, e o Diaféria estava lançando a segunda edição da sua novela Berra, coração pela Summus Editorial. Naquela época, em pleno regime ditatorial, Lourenço Diaféria era o jornalista que havia desafiado os militares - e muitos assim fizeram - com a publicação da crônica "Herói. Morto. Nós." em 1º de setembro de 1977, no jornal Folha de S.Paulo. Esse fato resultou na sua prisão, além de seu enquadramento na LSN (Lei de Segurança Nacional), pois o conteúdo foi considerado ofensivo às forças armadas. O texto tratava do heroísmo de um sargento que dera sua vida ao pular num poço de ariranhas para salvar um menino que lá havia caído. Em sua defesa ao ato do sargento, em certo momento, Diaféria diz: "Prefiro esse sargento ao duque de Caxias. O duque de Caxias é um homem a cavalo reduzido a uma estátua. Aquela espada que o duque ergue ao ar aqui na praça Princesa Isabel - onde se reúnem os ciganos e as pombas do entardecer - oxidou-se no coração do povo. O povo está cansado de espadas e cavalos. O povo urina nos heróis de pedestal". É claro que isso desagradou os militares. Naqueles tempos pensar diferente do que os donos do poder queriam, e mais, publicar aquilo que se pensava, era inadmissível. Para mim, um jovem que queria ser jornalista, não havia melhor exemplo; Diaféria era o homem que pensava e dizia o que queria, era o jornalista cumprindo a sua função social. Quando soube que ele estaria lá na Bienal autografando seus livros, pensei que seria uma boa oportunidade para conhecer o jornalista que para nós, candidatos a focas, era quase um mito. Principalmente nos anos 70, quando qualquer garoto dizia que queria ser jornalista, sempre havia alguém querendo nos demover dessa idéia considerada de jerico. Afinal, exemplos dessa temeridade não faltavam, o caso do Vladimir Herzog ainda estava recente. No dia e no horário previstos lá estava eu na fila, livro em punho, esperando a minha vez para receber o autógrafo. Chegou. Estendi o livro, disse o meu nome e recebi a dedicatória: “Ao amigo Franklin, ofereço esta parábola contra a violência e a favor da dignidade humana. Com o abraço do Diaféria. Agosto 78.” Ao receber o livro de volta não perdi a oportunidade e perguntei: - O que o senhor aconselha a um jovem que quer ser jornalista? Ele olhou sério para o meu rosto, por alguns segundos, e sentenciou: - Prepare-se bem. Agradeci e me despedi. Confesso que, naquela hora, fiquei um pouco decepcionado. Talvez esperasse a revelação de um guru ou algo assim, coisa típica de um jovem de 18 anos no fim do século passado. Hoje, trinta anos depois, tendo já percorrido todas as mídias como jornalista, sou obrigado a dizer: Lourenço Diaféria, você tinha razão. Fica aqui a minha pequena homenagem. Franklin Valverde é jornalista e editor da revista virtual ondalatina.com.br. Site pessoal: www.franklinvalverde.com.br . |
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Atualizado em ( 17-Set-2008 ) |
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