O conto “Nas areias de Sade” faz parte do livro Antes do zoológico, editado pela Patuá, em 2018, cuja edição está esgotada.
Na obra encontramos contos, microcontos e des-contos, novo gênero literário que é um microconto escrito utilizando somente as letras da palavra que dá título ao conto.
NAS AREIAS DE SADE
Não que ele quisesse, mas sempre havia alguém para insistir. Assim, não negava, executava. O processo não chegava a ser complexo. Era até meio sem nexo, faltando os elementos lógicos que os racionais exigem em todos e quaisquer momentos. Apesar disso – ou até por isso, quem sabe? –, cumpria a tarefa com os requisitos que ao seu mister competia. A reclamação não encontrava espaço naquele encrencado jogo. As disputas, mesmo que desiguais, apresentavam satisfação mútua, dando um sentido um tanto alucinado a tudo que ali ocorria. Os caminhos, dependendo da perspectiva, até ofereciam uma sinuosidade retilínea. Parecia absurdo, mas não, era real. A contemplação alheia arrancava perplexos sentimentos, misto de ojeriza e inveja, como sempre acontece nesses casos. Há falta de coragem para ser cruel ou excesso de ética em ser legal? Apesar de tudo a perversidade encanta a muitos, incentivando ao embarque em dolorosas viagens nas quais é dispensado o passaporte. Esse era o caso que a todos intrigava, deixando muitos com extrema perplexidade: eles em nada sofriam. Era como se todos esperassem algum deles dizer, parafraseando um poeta: não quero mais esse negócio, de você, longe de mim.
