franois_villon.jpgFrançois Villon, poeta francês do século XV, caracterizou-se em sua poesia pela temática da Morte.  Seu poema A Balada dos Enforcados (La Ballade des pendus), publicado em 1462, foi escrito na prisão, enquanto ele aguardava a execução da pena de morte a que fora condenado, por homicídio (a condenação por homicídio acabou sendo comutada pelo degredo, por dez anos).

Trata-se de um poema estranho e macabro, em que cadáveres de enforcados, pendurados, se dirigem aos vivos, aos quais exortam a não seguirem seu exemplo, a fim de obterem a misericórdia de Deus. Os versos remetem a uma reflexão sobre a própria miséria da condição humana.

É sabido que naquela época, em toda a Europa, os cadáveres dos condenados à morte por enforcamento eram deixados insepultos, pendurados nas forcas e sujeitos às intempéries e à ação dos corvos, até se consumirem completamente.  A não ser que alguém da família se apiedasse e desse sepultura ao desgraçado, o que era raro.

Os quatro primeiros versos do tétrico poema de François Villon são citados na introdução do romance-reportagem A Sangue Frio (In Cold Blood), do escritor norte-americano Truman Capote, que por cerca de sete anos investigou a história real do bárbaro assassinato, por dois delinquentes, de quatro pessoas de uma mesma família, numa cidadezinha perdida no estado de Kansas.

Capote acompanhou o caso desde a fase da investigação policial até o efetivo enforcamento dos criminosos, e produziu uma obra-prima do jornalismo literário que repercutiu em todo o mundo.  Em filme relativamente recente (Capote), a história da reportagem de Truman Capote é relatada, tendo o filme em questão sido estrelado por Philip Seymour Hoffman, ator falecido no início deste ano.

Eis os primeiros versos, em francês arcaico, do poema de Villon, citados na parte introdutória do romance-reportagem (A Sangue Frio, Truman Capote, trad. de Sergio Flaksman, Companhia das Letras, São Paulo, 2003):

Frères humains qui après nous vivez

N’ayez les coeurs contre nous endurcis

Car, si pitié de nous pauvres avez

Dieu en aura plus tôt de vous mercis.

E eis a respectiva tradução, livre, de Sebastião Uchôa Leite:

“Irmãos humanos, que ainda viveis,

Não sejais corações endurecidos;

Tendo pena de nós, pobres, talvez

De Deus sereis mais cedo merecidos.”