coxinha_-_franklin_valverde.jpgA história da família Di Cunto no Brasil se confunde com a da empresa de mesmo nome, a Di Cunto. A doceria e rotisseria funciona na rua Borges de Figueiredo, no mesmo local onde, em 1896, o patriarca Donato Di Cunto fundou uma padaria. Quase quarenta anos depois, em 1935, os irmãos Vicente, Lorenzo, Roberto e Alfredo reacenderam o antigo forno recuperado, iniciando a atividade de padeiros.

Foram inúmeras as adversidades ao longo dos oitenta anos de existência. Em 1936, apesar de as instalações serem modestas, já eram oferecidos produtos de excelente qualidade. O início foi difícil, mas a empresa venceu as adversidades iniciais e prosperou. No entanto, de 1942 a 1945, com o racionamento de produtos como gasolina, lenha, sal e farinha de trigo imposto pela 2ª Guerra Mundial, os irmãos Di Cunto se viram outra vez em sérias dificuldades.

Após inúmeros momentos de altos e baixos, a pujança da empresa a fez vencer as dificuldades. A Di Cunto representa hoje, inegavelmente, um ponto de atração da Mooca, orgulho para os moradores do bairro e para paulistanos dos mais diversos pontos da cidade.

Interessei-me pela história do lugar ao saborear, na semana passada, um doce chamado zeppola, ou doce de São José, que, por motivos religiosos, é produzido em maior escala, todos os anos, no dia 19 de março, dia consagrado a esse santo, figura muito representativa do catolicismo. Por sorte, a guloseima pode ser apreciada ao longo de todo o ano, não somente em março.

É bonito o lugar e muito próximo à estação Mooca da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, a CPTM, com conexão fácil ao metrô nas estações Brás (linha vermelha) e Tamanduateí (linha verde, a “linha da Paulista”). Todo decorado em tons de bege e marrom, de aparência simples, prima pela limpeza e pela boa apresentação dos produtos.

No entorno, há belas edificações, algumas muito antigas, como os galpões do lado par da rua que acompanham a linha do trem. Bem ao lado da doceria, um condomínio de apartamentos, todo trabalhado com tijolinhos, é um charme só.

É bem verdade que agora, muito recentemente, foram colocadas umas catracas pretas e metálicas na entrada, meio feias, que contrastam com a harmonia da decoração minimalista e destoam do ambiente familiar que se respira naquelas instalações. Marie, uma funcionária haitiana, contou que havia espertinhos indo embora sem pagar a conta.

Marie tem 23 anos de idade e três de Brasil. Saiu de Port-au-Prince com o marido dois anos depois do terremoto de 2010 que devastou o país centro-americano. Simpaticíssima, fala português impecavelmente. Só os bem atentos percebem algum sinal de francofonia em sua fala. Além dela, a Di Cunto emprega mais treze compatriotas seus, mas só ela lida com o público. Suponho que pela combinação de simpatia e pleno domínio do idioma português.

Além dos doces deliciosos na vitrine à esquerda de quem entra, no fundo do salão há um balcão irresistível para aqueles que apreciam bons salgados e bons pães. As coxinhas são o carro chefe e o agito ali é intenso.

Aline, minha amiga do trabalho e apreciadora de coxinhas como eu, ainda não sabe, como eu também ainda não sei, qual é a melhor coxinha da cidade, se a da Di Cunto ou a do Bar Veloso, na Vila Mariana. Mas não precisamos ter pressa, ainda pretendemos voltar a esses lugares muitas vezes para tirar nossas dúvidas e dar um veredito justo.

Na Di Cunto, além da limpeza e da beleza simples, percebe-se o apreço pelos antepassados italianos, são inúmeros os retratos de família simetricamente colocados nas paredes. Mas, seja como for, não há nada melhor que as coxinhas. Ouvi falar de quem prefere os quibes, as esfirras e, claro, os inúmeros doces. Eu mesmo já os provei todos, todos aprovados. Para mim, no entanto, tal como para Dom João VI, o rei fujão que veio para o Brasil em 1808, nada se compara às coxinhas. Voltei à Di Cunto três vezes na semana passada só para comer coxinhas. Será que engordam?

 

Ilustração: Franklin Valverde