2018 está sendo um grande teste de resistência. Não só no plano pessoal, já que, para mim, trata-se de um ano que não vai deixar saudades, mas principalmente no campo das coisas gerais, sociais, do mundo.
Num ano tão cansativo, chega então dezembro para renovar as esperanças de muitos, mas também a loucura do consumo do fim do ano e o calor senegalês; e então vêm também as redes sociais e mais uma vez nos devastam com notícias como a do cãozinho assassinado no supermercado de Osasco.
Maus tratos a animais são as piores atrocidades que os humanos podemos cometer. Animais são indefesos frente à capacidade ardilosa do homem de planejar, enganar, concatenar para o mal. O funcionário do supermercado, assassino, atraiu o pobre cãozinho faminto com mortadela envenenada. A partir disso, o pobre bichinho, entorpecido, ficou refém da sanha do facínora, de sua crueldade, de sua completa falta de humanidade. Além de envenenado, o cãozinho (que fora abandonado por seu dono naquele supermercado algumas semanas antes) também foi espancado a pauladas e acabou falecendo em atendimento veterinário.
Não é necessário ser especialista em absolutamente nada para saber sem a mínima sombra de dúvida que a covardia de quem maltrata um animal é algo injustificável, indefensável. É covarde quem bate num gato com uma vassoura, quem acorrenta um cachorro porque ele late demais, quem adestra elefantes com espancamento, quem doma leões com chicotadas, quem coloca um galo numa rinha. Quem faz essas coisas é covarde e vil.
Os animais são seres admiráveis, têm muito a nos ensinar sobre ética, respeito, amor e amizade. Eu sempre soube disso e os amei muito desde criança. Tanto que fiquei péssimo por semanas com a morte da cadela Baleia, narrada pela genial escrita de Graciliano Ramos num dos capítulos de Vidas Secas. Foi uma experiência terrível para mim, mas que me deixou como consolo, no entanto, o fato de ser ficcional (consolo que não consigo encontrar agora, no caso do cãozinho do supermercado – não se trata de ficção, de Baleia e Fabiano: é a realidade com uma face bem cruel).
Certa vez, a saudosa Cássia Eller afirmou na música Relicário que “o mundo está ao contrário e ninguém reparou”. Infelizmente, é isso. Tanto é certa essa afirmação que, perante as leis, os animais são considerados objetos. Mas como pode o homem considerá-los meros objetos? Que objetos são esses que só nos trazem amor e momentos de alegria? Alguém alguma vez já ficou amigo de um sapato? Já supôs que uma jarra pudesse ser sua companheira? Alguém aí já viu um celular abanar o rabinho?
Neste mundo louco, no qual estamos amando as coisas e objetificando os seres vivos, fico perdido, sem entender o que leva alguém a cometer atrocidades como as dessa triste notícia do cãozinho de Osasco, cujo destino cruel foi determinado por aqueles que o abandonaram, chancelado por aqueles que lhe foram indiferentes, e, finalmente, selado por um “humano”, uma besta-fera abominável e torpe.
Descanse em paz, cãozinho sem nome, amiguinho querido. São Francisco de Assis o receberá e curará todas as suas chagas. A esta altura dos tempos, frente a esta época descarrilada, de valores ao rés do chão, só o que nos pode consolar é a fé, a nossa humana fé que, por ser humana, é racional. Se os animais tivessem racionalidade e religião, não tenho dúvida de que o homem seria para eles a representação do demônio.
Para saber mais sobre o ocorrido com o cãozinho, recomendamos:
Para relembrar a morte de Baleia em Vidas Secas, recomendamos:
http://todoprosa.com.br/que-cena-a-morte-de-baleia-em-vidas-secas/ https://www.youtube.com/watch?v=WriQmEI_EGI
https://www.youtube.com/watch?v=j1rjC9GEo8k