O sete a um da seleção alemã de futebol masculino já tem um ano. Deu dor no coração perder de goleada do time alemão.
Não adianta juntar um time pouco antes de uma Copa começar: ganhar uma competição dessa importância é planejamento e trabalho de longo prazo. O que o brasileiro não entende é que não há lugar para o improviso, o mundo é governado pelo trabalho duro e pelo respeito às regras.
Não respeitamos as leis de trânsito, mas queremos que o nível de acidentes diminua. Sequer indicamos com a seta que vamos virar, mas desejamos um trânsito civilizado. Precisamos que o trânsito flua bem, mesmo ultrapassando o máximo da velocidade permitida ou indo devagar pela faixa da esquerda como se os outros não existissem.
O aluno não lê, mas quer ter vocabulário vasto, ortografia perfeita e sintaxe impecável para arrasar na redação. Não assiste aula, mas quer entender a explicação do professor. Quando aparece na escola, fica lá no fundo da sala, hipnotizado pelo celular, com suas fofocas de aplicativos e tititi de redes sociais, indiferente ao professor, mas quer tirar dez na prova. E assim vamos todos nos formando, como cidadãos e como povo, imbricados e mal ajambrados.
No futebol, nosso vizinho pequenino, o Paraguai, se vingou da guerra, nos tirou da Copa América. Que bom, nos fizeram um favor, evitaram que déssemos um vexame perante nossos arquirrivais argentinos. E o legado da Copa, cadê? Cadê o trem-bala? Era bala de festim? A região de Itaquera continua a mesma, foi esquecida do mapa do mundo do mesmo jeito repentino que passou a ser famosa.
Na economia, estamos, agora, em crise. Mas será que essa situação caótica começou agora ou vem de antes? Sei lá, não temos memória, brasileiro não lembra nem o que almoçou ontem. Só recordo que há pouco tempo era um tal de incentivo à linha branca, redução de impostos dos produtos, baixa no IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) dos carros. Consumo incentivado irresponsavelmente sem nenhum lastro, que o digam os milhões de endividados que agora não sabem como pagar o que devem.
Por falar no IPI dos automóveis, o prefeito de São Paulo, na contramão do incentivo à compra de carros, quer nos colocar a todos em bicicletas no meio do trânsito assassino e sem lei desta cidade caótica, prova histórica cabal da falta de planejamento e de organização que nos caracteriza como “bons” brasileiros. Ué, mas não incentivaram a compra de carro antes? Agora é para andar de bicicleta? É isso?
No meio de tanta demagogia no discurso, imaginemos se quem anda de carro passasse a usar o já saturadíssimo sistema de transporte público atual? “Bem, primeiro diminuímos a velocidade das duas avenidas Marginais e de outras vias vitais da cidade. Depois que for deflagrado o caos – e que milhões de paulistanos tiverem um ataque de nervos ou outro treco qualquer -, veremos o que fazer”. Na metodologia brasileira, planejamento é algo a posteriori.
O prefeito e seus asseclas – tão bonzinhos, uns fofos! – alegam que era preciso diminuir a velocidade nas Marginais porque o número de atropelamentos subiu. Os vendedores ambulantes, vítimas principais, surgem aos borbotões e ninguém faz nada para evitar que estejam lá, perigosamente, no meio dos carros.
Onde foram parar os programas habitacionais? E os programas sociais? E a fiscalização das vias, que deveria impedir que essas pessoas pusessem suas vidas e a dos outros em risco? Ora, não seria mais adequado tirar essa população das ocupações irregulares à beira das avenidas? Na lógica do planejamento à brasileira, não: combate-se o efeito, nunca a causa.
Mais curioso e controverso que tudo isso é o hábito de falarmos mal de brasileiro como se fôssemos noruegueses ou suecos, como se não déssemos pessoalmente nenhuma contribuição para o caos diário da vida cotidiana no país. Perder de sete a um da Alemanha? Que tristeza! É o “11 de setembro” da pátria de chuteiras! O resto, sem problema. Tirando o futebol, tá tudo ótimo – é o circo pegando fogo e a gente lavando elefante. Esses brasileiros são fogo, viu…
Ilustração: Franklin Valverde